O espaço para a resposta de política econômica durante a crise da COVID
A escolha dos instrumentos de política econômica durante a crise da COVID e a sua relação com o espaço para utilização dos mesmos.
Será que a capacidade de resposta de política econômica, o espaço para acomodar investidas monetárias e fiscais frente ao choque da COVID, foi fator relevante para as escolhas das ferramentas utilizadas pelos mais diferentes países? Podemos encontrar evidências para começar a responder à essa pergunta em artigo recentemente publicado no VoxEU, intitulado Responses to COVID-19: The role of policy space, no qual Katharina Bergant e Kristin Forbes sintetizam os resultados encontrados durante a sua pesquisa. Esse artigo, inclusive, levou-me para uma viagem ao passado.
A crise de 2008 e a política econômica
Confesso que esse assunto (o espaço para a política econômica) é um tema que me interessa não é de hoje. Como resultado da minha dissertação de mestrado profissional, publiquei o artigo A crise financeira e a política econômica: poderia ter sido diferente?, com uma pergunta de pesquisa muito semelhante: será que a capacidade de resposta de política econômica foi fator relevante para a severidade da Grande Crise Financeira de 2008? Escrevi no artigo:
“A hipótese da pesquisa baseia-se na idéia de que i) taxas de juros mais altas representam uma maior capacidade de resposta de política monetária porque quanto maior o nível pré-crise, maior é espaço para cortes na mesma e, portanto, o coeficiente da variável na regressão deveria ser positivo; ii) analogamente, governos que incorrem em melhores resultados nominais poderiam responder à crise através de estímulos fiscais mais facilmente, portanto, o coeficiente desta variável também deveria ser positivo.”
Vou me permitir introduzir aqui uma longa citação com um trechos das considerações finais do artigo:
“A capacidade de resposta da política econômica se mostrou fator relevante para minimizar os efeitos da crise financeira no seu primeiro ano. Em relação à política monetária, países que experimentaram taxas de juros maiores no final de 2007 apresentaram um maior espaço para implementação de políticas expansionistas e tiveram uma crise menos severa. Taxas de juros nominais mais altas podem tornar mais difícil que um país seja preso na armadilha da liquidez. Assim, os instrumentos usuais disponíveis aos bancos centrais seriam suficientes (ou pelo menos mais potentes) não apenas para suavizar os ciclos de negócio, mas para combater crises não tão severas, além de proporcionar maior capacidade de resposta à crises financeiras que, em geral, têm não somento um desenvolvimento hermético, como também a sua resolução.
Na análise da política fiscal, embora os coeficientes do resultado do governo central confrontem a hipótese apresentada, a variável de interação fiscal que capta a gestão feita não apenas considerando o fluxo no ano de 2007, mas também o endividamento bruto público aponta na direção da hipótese do trabalho de que países que vivenciam uma melhor situação fiscal sentiram menos os efeitos da crise financeira através da variação do produto no primeiro ano do evento, pois apresentavam um maior espaço para instaurar estímulos fiscais de curto prazo.”
E para a crise da COVID?
A crise da COVID e a política econômica
Voltemos ao artigo que originou este texto. Para a resposta de política econômica, parece que temos para a crise da COVID evidência semelhante à que eu encontrei na minha análise cross-country para a crise de 2008. Àquela altura, o espaço para a política econômica estava associado à severidade da crise, quando essa é medida pela variação do PIB frente ao ano anterior. Na crise da COVID, a escolha dos instrumentos estava associada ao espaço para utilizá-los. Tudo mais constante, países com maiores taxas de juros utilizaram mais esse instrumento, uma vez que há mais espaço para cortes e, portanto, maior impacto (esperado) da política monetária em comparação à países com juros menores já no início do episódio; já as economias com uma melhor gestão fiscal puderam se ver com menos amarras na hora de utilizar desse tipo de aparato durante a Pandemia. É verdadde que os países de desenvolvidos (apenas para essa crise, segundo os autores) apresentaram menos as restrições fiscais no combate à pandemia, independentemente do espaço (algo que não parece ser indicado pelos dados para as economias emergentes). Esse ponto merece ser aprofundado em pesquisas futuras.
Ainda no tema da resposta de política econômica durante a crise da COVID, no que tange a intesidade da mesma, em Is democracy affecting the economic policy responses to COVID-19? A cross-country analysis, António Neto e este escriba percebemos que o arcabouço institucional também pode estar relacionado às respostas (macroeconômicas) iniciais à pandemia da COVID. Estamos em fase de atualização do artigo, devo escrever algo sobre ele no futuro.
Tem muito espaço (sem nenhum trocadilho aqui) para a pesquisa acerca da capacidade (de resposta) fiscal e monetária das mais diferentes economias. Seu estudo é crucial para prepararmos o arcabouço de política econômica para as crises futuras, porque, acredite, elas virão.