Um modelo semiestrutural simples para a economia brasileira
Arcabouço para ajudar a construir cenários para a economia brasileira e a compreender um ferramental poderoso de análise macroeconômica.
A análise macroeconômica por vezes faz uso do ferramental quantitativo para subsidiar as suas conclusões. Quando pensamos na construção de cenários, muitas vezes é possível que direcionemos a nossa busca por modelos na Econometria de Séries Temporais. Há também quem utilize o rico laboratório fornecido pelos modelos DSGE, que contemplam arcabouços estruturais microfundamentados para suportar a análise. Mas há um meio do caminho: os modelos semiestruturais.
Por que “semi”? A ideia é que as suas equações não são decorrentes de decisões microeconômicas, como no caso dos modelos de equilíbrio geral dinâmicos e estocásticos, mas ainda assim possuem uma “estrutura” proveniente da teoria econômica. Para iniciar nessa esfera, eu recomendo dois artigos de pesquisadores do FMI (na verdade, esses artigos são quase os mesmos, um deles tem o propósito de ser mais sintético):
Berg, Andrew, Philippe D Karam, and Douglas Laxton. 2006a. “A
Practical Model-Based Approach to Monetary Policy Analysis-Overview.”
Berg, Andrew, Philippe D Karam, and Douglas Laxton. 2006b. “Practical Model-Based Monetary Policy Analysis: A How-to Guide.”
A partir deles, pode-se compreender melhor as estruturas em modelos como, por exemplo, o desenvolvido no Banco Central do Brasil (BCB). Para que a jornada seja um pouco menos desafiadora, criei um modelo bem simples para o Brasil, cujo objetivo é ajudar a quem queira começar a se aventurar nessa área a compreender certas estruturas que muitas vezes se repetem em diferentes modelos.
O modelo para o Brasil
O modelo é composto por quatro equações que sintetizam as escolhas dos agentes em uma economia (pelo lado da oferta agregada — a curva AS — e dinâmica das expectativas de inflação; pelo lado da demanda agregada temos as curvas IS e MR) e duas equações com definições (inflação acumulada em 12 meses e a taxa de juros real a partir da equação de Fisher).
A curva de oferta agregada
Ainda que muitos livros e artigos chamem a curva abaixo (ou uma versão dela) de curva de Phillips, isso me incomoda o suficiente para manter a bravata lembrar, sempre que possível, que a relação (positiva) entre a taxa de inflação e o hiato do produto é a curva de oferta agregada (AS):
Note que, como a expectativa de inflação está em termos anualizados, e o modelo é linear, eu divido por quatro para manter a taxa de inflação como uma variação trimestral. Sem isso, o modelo ainda funcionaria, mas seria a taxa de inflação trimestral anualizada.
A dinâmica das expectativas
A equação que representa a formação das expectativas no modelo foi inspirada na equação (5) do modelo do BCB:
É importante perceber que esse tipo de dinâmica assume certa hibridez na formação das expectativas: uma parcela adaptativa, uma parcela racional (eu não utilizei o operador esperança apenas por uma simplificação da notação) e uma parcela ancorada na meta, sem falar em possíveis choques exógenos que distanciem as expectativas desses três componentes.
Finda a parte da oferta agregada do modelo, podemos seguir agora para as equações que descrevem a dinâmica do lado da demanda.
A curva IS
O equilíbrio no mercado de bens e serviços é representado pela equação abaixo:
A regra de política monetária (MR)
A determinação da taxa de juros nominal (a taxa Selic) é dada por uma função de reação do banco central inspirada na equação (3) do modelo do BCB:
A combinação da curva IS com a curva MR resulta na curva de demanda agrega (AD).
Calibração
Os exercícios quantitativos a seguir utilizaram a seguinte calibração:
Projeções com o modelo semiestrutural
O que o modelo projeta para a economia brasileira nos próximos trimestres? (Não é a minha projeção, é importante que se diga, apenas um exercício quantitativo com base em um modelo bem simplificado)
Pensando na taxa de juros nominal, a taxa Selic, ela chegaria até 14% ao ano (, com o hiato do produto se tornando negativo no começo deste ano. As expectativas de inflação convergiriam para 4,9% e se manteriam por lá até o final de 2026. A inflação acumulada em quatro trimestres convergiria para 4,29% (lembre-se que isso também é resultado da calibração de uma inflação de equilíbrio de 4% ao ano).
Espero que o modelo te ajude a começar a compreender esse universo fascinante dos modelos semiestruturais!