As crises no México e o papel dos bens intermediários
Para compreender as flutuações econômicas no México, faz-se importante considerar o papel dos bens intermediários importados.
A economia mexicana atravessou duas crises com naturezas e dinâmicas muito distintas, primeiro em 1995 e depois em 2008 (não foram as únicas recessões nesse intervalor, no entanto). Na década de 1990, vulnerabilidades externas que foram se acumulando ao longo dos anos tornaram inevitável uma crise cambial, especialmente após os eventos de dezembro de 1994, com o assassinato de um dos candidatos à presidência do país. Já em 2008, além dos desdobramentos naturais para economias emergentes de uma crise que se deu, especialmente, nos países desenvolvidos (mais sobre ela aqui), a proximidade e integração econômica com os EUA (epicentro da crise de 2008) também contribuíram um episódio de magnitude relevante.
Distantes não apenas pelo tempo, as duas crises também encontram referências distintas naquele “alfabeto ilustrativo dos tipos de recessões” que economistas gostam de utilizar. Em 1995, vimos algo mais parecido com um “V”, ao passo que a Grande Crise Financeira de 2008 teve um formato próximo do “L”. Podemos ver isso no primeiro gráfico da figura abaixo, que retrata o comportamento do PIB real (dividido pela população em idade laboral):
A dinâmica das horas trabalhadas, do investimento e da soma do consumo do governo com as exportações líquidas também é divergente entre as crises. Como referência, a crise decorrente da COVID também levou as variáveis macroeconômicas à “formatos próprios”.
Parece claro que são crises diferentes, mas será que possuem semelhanças?
O papel dos bens intermediários
No artigo recém publicado intitulado “Accounting for Mexican business cycles”, Pedro Brinca e eu abordamos justamente essa questão.1 Primeiro, utilizamos uma técnica chamada “Business Cycle Accounting” (também temos um trabalho para discussão sobre ela, disponível aqui) para entender os principais mecanismos que explicam o fenômeno. Ao identificarmos que, para compreendermos os fenômenos em questão, precisaríamos analisar a relação entre os fatores de produção e o volume produzido, percebemos que a economia Mexicana possui uma característica importante: a produção de bens finais depende muito de bens intermediários importados. Para se ter uma ideia, o gráfico abaixo expõe o percentual do PIB referente à participação desses tipos de bens intermediários:
Assim, curiosamente, a economia mexicana está sujeita à choques externos de uma maneira um pouco diferente do que outras que não possuam esse mesmo tipo de estrutura produtiva. Explico. Imagine que, por exemplo, os preços internacionais cresçam mais do que os preços domésticos. Isso poderia estimular economia doméstica, certo? Não é tão simples. Esse aumento faria com que os bens intermediários importados fossem mais caros, o que desestimularia a produção das empresas e, com isso, a renda cairia. Ou seja, não foram alterados os fatores de produção (capital e trabalho), mas com a mesma quantidade deles, produz-se menos. Há, portanto, uma perda de “eficiência” relacionada a esses tipos de choques de preços relativos.
O modelo simples que desenvolvemos no artigo consegue capturar, com apenas um choque, os diferentes formatos (“V” e “L”) das duas crises. A crise da COVID possui mecanismos e determinantes diferentes, por isso analisamos os resultados com muito, muito cuidado, apenas em caráter ilustrativo, no apêndice, e mantemos o foco nos episódios de 1995 e 2008.
Portanto, sim! Há semelhanças entre os dois episódios e esse parece ser um canal importante para entender (i) transmissões de crises internacionais que estavam “escondidas” nessa (in)eficiência econômica e (ii) as flutuações da economia mexicana.
Brinca, P., & Costa Filho, J. (2023). Accounting for Mexican business cycles. Macroeconomic Dynamics, 1-23. doi:10.1017/S1365100523000159